Análise de Vídeos do Youtube através da abordagem metodológica Netnografia

Por Katia Godoi, docente da UNIGRAN  – Brasil

O texto apresentado tem por base a carta editorial escrita para a edição especial dos Cadernos de Educação, Tecnologia e Sociedade, que tem como tema central a “Abordagem Metodológica da Netnografia na Educação: encurtar as distâncias entre tempo e espaço”.

O presente tópico traz uma análise inicial da abordagem metodológica da netnografia. Para tanto, discutimos a definição do termo, que segundo Kozinets (2014) é uma forma especializada de etnografia, a qual utiliza as comunicações mediadas por computador como fonte de dados para chegar à compreensão e à representação etnográfica de um fenômeno cultural na, pela e para a internet. A especificidade do “na”, “pela” e “para” a internet está relacionada com o sentido ou direção do fenómeno cultural. O fenómeno começa no mundo presencial e vai para o mundo virtual, começa no mundo virtual e se propaga para o mundo presencial ou se estabelece exclusivamente no virtual. Assim, poderíamos ter pelo menos três categorias de contextos culturais para a netnografia: i) do presencial ao virtual, ii) do virtual ao presencial, iii) exclusivamente virtual. Neste sentido, essa abordagem pode ser utilizada para estudos de fóruns de discussão, grupos de notícias, blogs, redes sociais, comunidades online, entre outros espaços online.

A metodologia da netnografia, inicialmente explorada pela área de Marketing (KOZINETS, 1998, 2002) e Comunicação (HINE, 2004), vem ganhando espaço em outras áreas do conhecimento, como a Educação, que têm contribuído para a discussão e utilização desta metodologia, apresentando as formas de estudos que abarcam a netnografia e os seus procedimentos.

Como em outras metodologias de pesquisa, a netnografia possui um corpo de procedimentos. Esses, por sua vez, são dinâmicos e podem acontecer simultaneamente. Assim, de acordo com Kozinets (2002, 2014), o netnógrafo tem decisões fundamentais a tomar antes do primeiro contato com uma comunidade online. A entrada, ou seja, o primeiro procedimento refere-se à entrée cultural, na qual são tomadas decisões sobre a preparação para o trabalho de campo, como a identificação da comunidade online, temas e questões que serão investigadas, formulação da pergunta de pesquisa, além da forma como o pesquisador se apresentará e se inserirá ao grupo pesquisado. O pesquisador deve deixar claro o ponto de observação ao fazer as considerações sobre seu objeto, pois seu posicionamento pode interferir na forma como os dados serão coletados e analisados.

O segundo consiste na coleta de dados. Para Kozinets (2014) existem três tipos de capturas importantes na coleta de dados: A primeira consiste em copiar diretamente de comunicações mediadas por computador dados da página do grupo observado (p. ex.: comunidades virtuais, blogs, redes sociais), textos, imagens, áudios ou vídeos, ou seja, dados em cuja criação e mediação o pesquisador não esteja diretamente envolvido. A segunda coleta refere-se aos dados que o pesquisador cria por meio da interação com os membros das comunidades, por exemplo, entrevistas por e-mail, chat, mensagens instantâneas e outros meios digitais. O terceiro tipo de coleta diz respeito às notas de campo do pesquisador, sobre as práticas comunicacionais dos membros das comunidades, suas interações e interpretações, bem como a própria participação e o senso de pertencimento do pesquisador no grupo.

A análise e interpretação contempla o terceiro procedimento, o qual reside no processo de interpretar os dados coletados e produzidos da participação e da observação netnográfica, a partir da literatura requerida e os dados emergentes. Nas etapas de organização, coleta e análise de dados o pesquisador pode utilizar em suas pesquisas vários tipos de ferramentas, como por exemplo, o Google Académico, assim como utilizar pacotes de software para a organização e análise de dados qualitativos, como é o caso do webQDA.

No que diz respeito à ética de pesquisa, o quarto procedimento de que o netnógrafo deve assegurar-se, diz respeito ao que Kozinets (2014) pontua como aspectos importantes para garantir a idoneidade da pesquisa: identificar-se, informar e dialogar com os participantes sobre a pesquisa; pedir permissões apropriadas, garantindo o anonimato; obter consentimento quando necessário; citar e dar o devido crédito aos participantes da pesquisa.

Por fim, o quinto procedimento está relacionado à verificação dos participantes (member check), Kozinetz (2014) propõe a validação da pesquisa, no intuito de apresentar as interpretações sobre as observações realizadas aos participantes, além de ouvir suas opiniões sobre o que foi escrito e se está coerente ou não com o contexto que eles vivem. A partir dessa devolutiva, pode-se chegar a insights e conclusões além das observadas em campo.

O fato do webQDA permitir analisar vídeos, por exemplo, disponíveis num canal do Youtube “facilita” a aplicação de uma abordagem netnográfica. Nesse sentido, o investigador deverá utilizar as “Fontes externas” inserindo apenas o link do vídeo, na qual é possível criar segmentos de texto, a partir de transcrições, descrições e/ou interpretações, ou ainda, elaborar uma combinação desses elementos em vários trechos do vídeo. Vale destacar ainda que os segmentos de texto têm como finalidade serem codificados nas respetivas categorias para fins de análise (ver figura).

análise de vídeo

Figura – Análise de vídeo através da funcionalidade Fonte Externa

 

A partir desse corpo de procedimentos e a possibilidade de análise de vídeo no webQDA, podemos compreender que a netnografia pode encurtar as distâncias entre tempo e espaço, devido à própria dinâmica da internet, na qual os agrupamentos sociais estão dispostos em rede. Tais agrupamentos podem funcionar tanto no espaço online, como coexistir fora dele, no espaço offline. Nesse sentido, os pressupostos da etnografia, que são o caráter investigativo e de observação da realidade do outro, continuam presentes na abordagem netnográfica.

 

Referências

Barros, V. F. de A., Costa, A. P., Silva, K. A. de G. e, Castro, P. A. de, & Pais, S. (2017). Abordagem Metolológica da Netnografia na Educação: encurtar as distâncias entre tempo e espaço (Carta Editorial). Cadernos de Educação, Tecnologia E Sociedade, 10(1), 1–8. https://doi.org/https://dx.doi.org/10.14571/cets.v10.n1

HINE, C. Etnografía virtual. México: Editorial UOC, 2004. Disponível em: <https://seminariosocioantropologia.files.wordpress.com/2014/03/hine-christine-etnografia-virtual-uoc.pdf>. Acesso em: Jan. 2017.

KOZINETS, R. On netnography: inicial reflections on consumer research investigations of cyberculture. Advances in Consumer Research, 1998, v. 25, pp. 366-371. Disponível em: <https://www.acrwebsite.org/search/view-conference-proceedings.aspx?Id=8180>. Acesso em: Jan. 2017.

KOZINETS, R. The field behind the screen: using netnography for marketing research in online communities. Journal of marketing research, 2002, v. 39, n. 1, pp. 61-72.

KOZINETS, R. V.. Netnografia: Realizando pesquisa etnográfica online. Porto Alegre: Penso, 2014.

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