Investigação Qualitativa: Semelhanças entre metodologias e metodologias*

Por Francislê Neri de Souza, Universidade de Aveiro

A Investigação Qualitativa é pautada por diferentes metodologias, técnicas e ferramentas. Quando estudamos estas diferenças queremos reforçar a especificidade, a eficiência e a eficácia do desenho metodológico em relação aos objetivos e questões de investigação que queremos responder.

Estes fundamentos fazem-nos lembrar que a metodologia tem, apesar das suas limitações, um papel definitivo para distinguir as conclusões da ciência da mera especulação ou superstição quotidiana. Quando discutimos investigação qualitativa versus investigação quantitativa em educação e nas demais ciências humanas e sociais, geralmente apontamos para as diferenças destas duas abordagens de investigação com o objetivo louvável de estabelecer limitações e aplicações de cada uma delas. Não estaremos esquecendo de refletir sobre as semelhanças? Não seriam estas semelhanças que integrariam as diferentes abordagens e paradigmas como ferramentas científicas?

Somente para recordar algumas das principais diferenças entre ambas as abordagens metodológicas, nas dimensões epistemológicas, axiológicas, ontológicas, etc. listamos algumas palavras-chave. Enquanto na investigação quantitativa temos: os números, o ponto de vista do investigador, o investigador distante, o teste de teorias, a estatística, a generalização, os dados exatos e confiáveis, o macro, os comportamentos, as conjunturas artificiais, etc. Na investigação qualitativa temos respetivamente: as palavras, o ponto de vista dos participantes, o investigador próximo, as teorias que emergem, o processo, a compreensão do contexto, os dados ricos e profundos, o micro, os significados, a conjuntura natural, etc.

Embora seja importante o estabelecimento das diferenças e peculiaridades de cada uma, gostaríamos de focar brevemente na questão das semelhanças. Se existem, e quais são? Para Bryman (2012) as semelhanças entre a investigação qualitativa e quantitativa podem ser resumidas em nove itens. Ambas:

i) estão preocupadas com a redução dos dados;

ii) querem responder a questões de investigação;

iii) procuram relacionar a análise dos dados com a investigação já publicada;

iv) estão preocupadas com a variação;

v) tratam as frequências como um trampolim para a análise;

vi) procuram assegurar que distorções deliberadas não ocorram;

vii) argumentam a importância da transparência;

viii) abordam a questão do erro;

ix) estão preocupadas que as metodologias de investigação devam ser apropriadas às questões de investigação.

Para além da lista deste autor poderíamos acrescentar que em ambas as abordagens os investigadores estão à procura de: i) sínteses e padrões; ii) sistematização da análise dos dados; iii) rigor das conclusões; e iv) aplicação relevante e reflexão sobre as implicações nas áreas especificas da ciência, da tecnologia e da sociedade. Observando ambas as listas reconhecemos os padrões próprios da ciência, a que deveríamos acrescentar que ambas as abordagens metodológicas estão preocupadas com as questões éticas e da cidadania.

Se ambas as metodologias estão preocupadas com tantos pontos em comum, o que tornaria uma inferior à outra? Naturalmente pode existir a má aplicação dos princípios metodológicos em ambas as abordagens, que as transformam numa má ciência independentemente de ser centrada no quantitativo ou no qualitativo. No entanto, não se pode afirmar que uma metodologia é “menos científica” do que a outra se ambas são regidas por vários parâmetros científicos semelhantes.

O que a tese das semelhanças pretende defender é que ambas as ciências seguem caminhos diferentes, mas preocupadas com o rigor, a sistematização e “verdades” próprias da ciência. Uma vantagem que a investigação qualitativa apresenta atualmente é a disponibilização de software que facilita e potencializa a transição dos dados não-numéricos para os dados numéricos de acordo com necessidade e fundamentação do investigador. Na figura a seguir (webQDA) podemos ver apontados a possibilidade de cruzamento de categorias codificadas a partir de textos, contagem de números referências, exportação para o Excel® e transformação em gráficos e/ou índices estatísticos. Veja que a conexão entre o valor numérico e o conteúdo não-numérico (textual) nunca é perdido, cabendo ao investigador a escolha da linguagem adequada na escrita académica (Neri de Souza, Neri de Souza, & Moreira, 2016).

 

webQDA Dados Qualitativos

 

Toda esta transição entre o não-numérico e o numérico, mesmo que se use estatística descritiva ou inferencial, não transforma a investigação qualitativa em quantitativa ou mista, porque esta designação da natureza da investigação depende muito mais das questões e desenho de investigação como um todo do que somente do tratamento final e/ou da linguagem da escrita de resultados.

Referências Bibliográficas

Bryman, A. (2012). Social Research Methods (4th ed.). Oxford: Oxford University Press.

Neri de Souza, F., Neri de Souza, D., & Moreira, A. (2016). Diversidade de Contextos e Dados: Corpus Latente na Internet – Um Desafio para os Métodos Mistos. Internet Latent Corpus Journal, 6(1), 1–6.

*Saiba mais em:

revistas.ulusofona.pt/index.php/rleducacao/article/view/5674/3570

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