Análise Discursiva com auxílio do webQDA

Análise Discursiva com auxílio do webQDA

Por: Carolina Lopes Araújo (Universidade de Brasília)

O webQDA é uma ferramenta útil para auxiliar pesquisas com embasamento metodológico da análise discursiva. O software permite tratar dados em formatos diversos (texto, imagem, áudio e vídeo nos principais formatos de arquivo eletrônicos usados para os registros desses tipos de materiais) sendo possível, para tanto, importar as fontes de dados como fontes internas. Como fontes internas, os materiais que comporão o corpus de pesquisa são armazenados e estarão acessíveis na plataforma do webQDA. Outra forma de importar fontes, mas sem onerar o tamanho de seu projeto (em Gb), é compor seu corpus de investigação com fontes externas. Nesse caso, os dados de sua pesquisa estarão armazenados em outros espaços virtuais e estarão acessíveis na plataforma do webQDA por meio de links para acesso remoto.

Para a organização das fontes de dados – sejam fontes internas ou externas, é possível indicar atributos que ajudam a classificar os elementos do corpus da pesquisa. A ferramenta “Classificação” permite gerar os atributos – e seus respectivos valores – que marcam as fontes e permitem filtrá-las (selecioná-las) segundo os valores de seus atributos. A ferramenta  “Classificação” também pode ser aplicada a códigos – sobre os quais falaremos no próximo parágrafo. Antes, vale ressaltar que as classificações marcam o elemento (a fonte ou o código) em sua totalidade. Mas, se necessário designar atributos apenas a um excerto da fonte ou a uma parte do material codificado, o software oferece a ferramenta “Descritores”, pelo qual se confere atributos a frações do material analisado.

O cerne do processo de tratamento de dados no webQDA está em gerar categorias de análise – aqui chamadas de códigos – e aplicá-las aos dados. Pelo processo de codificação, é possível sinalizar nas fontes de dados a vinculação dos dados com as devidas categorias. Por exemplo, categorias temáticas são recorrentemente utilizadas nas pesquisas qualitativas e permitem mapear os principais temas representados nos dados da pesquisa. O webQDA permite que sejam criados códigos à conveniência da investigação, distinguindo entre códigos livres e códigos-árvore. Os códigos-árvore se caracterizam por presumir que as categorias principais se desdobram em sub-categorias. Os códigos livres não contam com sub-categorias (sub-códigos).

Quando fundamentamos a pesquisa no referencial metodológico da Análise de Discurso Crítica (ADC), a teoria nos oferece um conjunto de categorias sociodiscursivas que ajudam a desvelar discursos e os modos pelos quais eles são representados nos textos (Ramalho e Resende, 2011; Resende e Ramalho, 2011). É recorrente que, na literatura sobre a ADC, as categorias sociodiscursivas se desdobrem em sub-categorias que permitem refinar o detalhamento das análises, portanto, os códigos-árvore do webQDA parecem mais apropriados para acondicioná-las no projeto. Para exemplificar, tem-se que a estrutura de categorias proposta por Araújo, Carmo e Fraga (2018) pode ser detalhada em outras sub-categorias, como o caso da categoria de representação de atores sociais para a qual se abre um novo leque de sub-codificação ao se considerar a estrutura proposta na clássica obra de van Leween (2008). Já as categorias “Modalidade”, “Avaliações” e “Pressuposições” podem se multiplicar nas subcategorias do Sistema de Avaliatividade proposto por Martin e White (2005). A depender dos objetivos de pesquisa, da natureza dos dados e do embasamento metodológico, o pesquisador haverá de selecionar as categorias e o nível de detalhamento (isto é, quantos níveis de sub-categorias) a considerar em seu projeto.

Uma vez codificadas as fontes, as ferramentas de “Questionamentos” oferecidas pelo webQDA podem auxiliar na análise de dados. Muito usual, o questionamento sobres as “Palavras mais Frequentes” permite gerar listas e nuvens de palavras que auxiliam desvelar os campos semânticos ativados pelos discursos representados nos dados. É possível selecionar os dados a considerar nessa consulta (Questionamento > Palavras mais Frequentes > Restrições), filtrando por fonte, ou por códigos, ou pelos atributos em que estejam classificados.

Outro recurso de “Questionamento” do webQDA forma “Matrizes” que revelam a sobreposição de marcações dos dados (concomitâncias entre marcas de origem dos dados por fonte, marcas de categorias em que os dados foram codificados ou marcas de valores de atributos em que estejam classificados). Ao cruzar atributos de “Classificações”, a “Matriz” ajuda a apresentar a caracterização dos dados da pesquisa. Se a matriz cruza categorias temáticas com atributos de classificação, ela permite a análise estratificada de ocorrência dos temas nos dados. Também é possível cruzar categorias temáticas com categorias de análise de conteúdo.

No que concerne a Matrizes envolvendo as categorias sociodiscursivas da ADC, um cruzamento muito útil é a sobreposição das categorias temáticas com categorias da ADC, para revelar como alguns temas são representados nos dados. Por exemplo: o cruzamento das categorias temáticas com a categoria “Intertextualidade” pode mostrar sobre quais temas os dados convocam (ou dão espaços de manifestação a) outras vozes que não a voz autoral. Já ao cruzar as categorias temáticas com a categorias “Modalidade” pode-se revelar quais temas são enfatizados ou são atenuados nos dados. É possível, ainda, cruzar as categorias sociodiscursivas da ADC entre si para desvelar relações entre elas. Um exemplo é o cruzamento dos modos de referência com os modos de representação dos atores sociais que pode ser visto nos trabalhos de Ramalho (2020) e Mendonça (2020).

No webinar Introdução à Análise Discursiva com uso do webQDA (ver abaixo) foram apresentados os principais comandos e ferramentas do webQDA que podem auxiliar interessados em desenvolver a análise discursiva com o auxílio do software. Em um exercício de manuseio do software no processo de codificação, o vídeo propõe uma estrutura de categorias sociodiscursivas da ADC no intuito de fornecer uma visão panorâmica das possibilidades de análises favorecidas pela ADC e das potencialidades do webQDA. No entanto, não se pretende que seja uma estrutura exaustiva e nem todos códigos (categorias) sejam utilizados em uma mesma pesquisa. A fundamentação metodológica e teórica e a definição dos objetivos de pesquisa são imprescindíveis para uma boa seleção das categorias convenientes para sua pesquisa.

 

Referências:

ARAUJO, Carolina Lopes; CARMO, Eliane Almeida do; FRAGA, Raiza Gomes (2018). Percurso de jovens pesquisadores em investigação qualitativa interdisciplinar embasada na análise de discurso crítica (ACD) com o auxílio do software Nvivo®. In: CONGRESSO IBERO-AMERICANO EM INVESTIGAÇÃO QUALITATIVA, 7., 2018, Fortaleza. Atas… Fortaleza: UNIFOR; UAEM; Ludomedia, 2018. p. 154-163. Disponível em: < https://repositorio.unb.br/handle/10482/32343 >. Acesso em: 03 jul. 2020.

MARTIN, J. R.; WHITE, P. R. R. (2005). The evaluation of language: Appraisal in English. Hampshire: Palgrave Macmillan.

MENDONÇA, Daniele Gruppi de (2020). População em situação de rua: como as ações e políticas públicas são representadas na Folha de São Paulo. 2020. 243 f., il. Dissertação (Mestrado em Linguística) — Universidade de Brasília, Brasília. Disponível em: < https://repositorio.unb.br/handle/10482/38795 >. Acesso em: 03 jul. 2020.

RAMALHO, Ingrid da Silva (2020). Representação discursiva da violência e da violação de direitos contra pessoas em situação de rua nas plataformas on-line do Correio Braziliense (2014 a 2018). 2020. 203 f., il. Dissertação (Mestrado em Linguística Aplicada) – Universidade de Brasília, Brasília, 2020. Disponível em: < https://repositorio.unb.br/handle/10482/38945 >. Acesso em: 03 jul. 2020.

Ramalho, V., & Resende, V. (2011). Análise de discurso (para a) crítica: o texto como material de pesquisa. Campinas: Pontes Editores. Disponível em: https://www.academia.edu/16380228/An%C3%A1lise_de_discurso_para_a_cr%C3%ADtica_o_texto_como_material_de_pesquisa>. Acesso em: 03 jul. 2020.

Resende, V. d., & Ramalho, V. (2011). Análise do Discurso Crítica (2a ed.). São Paulo: Contexto. Disponível em: < https://www.academia.edu/16380216/An%C3%A1lise_de_discurso_cr%C3%ADtica >. Acesso em: 03 jul. 2020.

Van Leeuwen , T. (2008). The representing of social actors. Em T. Van Leeuwen, Discourse and practice: New tools for critical discourse analysis (pp. 23-54). New York: Oxford University Press. Disponível em: < https://www.academia.edu/36639478/Van_Leeuwen_Theo_Discourse_and_Practice._New_Tools_for_Critical_Discourse_Analysis >. Acesso em: 03 jul. 2020.

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