Peculiaridades da Análise do Discurso

Por António Pedro Costa, Universidade de Aveiro

Um projeto de investigação com uma abordagem qualitativa carece de uma clarificação sobre detalhes metodológicos que o investigador irá preconizar e, não menos relevante, a técnica de análise dos dados (Costa & Souza, 2016). Uma das técnicas de análise qualitativa de dados mais utilizada é a Análise de Conteúdo (Amado, Costa, & Crusoé, 2014; Bardin, 2004). Poderíamos afirmar que Análise de Conteúdo está inserida na Análise de Discurso ou que esta é um desdobramento da primeira? Quais as peculiaridades e diferenças entre a Análise de Discurso e a Análise de Conteúdo? Que procedimentos técnicos e ferramentas poderiam ser usadas em cada uma delas? São semelhantes ou completamente diferentes? Responder a estas e outras questões poder-nos-ia ajudar a refletir e a melhorar os métodos qualitativos de análise. No entanto, neste editorial não iremos responder a todas elas, apenas apontar para sua importância e refletir sobre o uso da Análise de Discurso.

Ambas as técnicas assentam na análise categorial, com procedimentos técnicos semelhantes, mas são bastante distintas relativamente aos seus objetivos. Para Rocha e Deusdará, (2006, p. 307) a Análise do Discurso surge no final da década de 1960 como resposta à insuficiência da análise de texto que se praticava na época. Nesta época, a análise centrava-se numa “visão conteudista”, caracterizada pelos processos presentes nos estudos com Análise de Conteúdo. Os mesmos autores afirmam que “a problemática da discursividade surgida com as contribuições da Análise de Discurso propõe o entendimento de um plano discursivo que articula linguagem e sociedade, entremeadas pelo contexto ideológico. A Análise de Discurso, portanto, pretende não instituir uma “nova linguística”, mas consolidar uma alternativa de análise, mesmo que marginal, à perspetiva “tradicional”. Um alargamento teórico, uma possibilidade outra, originada de um olhar diferenciado que se lança sobre as práticas linguageiras” (2005, p. 308).

Segundo Catalina, Caregnato e Mutti (2006) “a AD trabalha com o sentido e não com o conteúdo do texto, um sentido que não é traduzido, mas produzido” (p. 680). Os mesmos autores afirmam que o corpus da AD é constituído pela seguinte formulação:

a) Ideologia: entendida como o posicionamento do sujeito quando se filia a um discurso;

b) História: representa o contexto sócio-histórico;

c) Linguagem: é a materialidade do texto gerando “pistas” do sentido que o sujeito pretende dar (Catalina et al., 2006).

Na linha de pensamento dos mesmos autores a “Análise de Discurso trabalha com o sentido, sendo o discurso heterogéneo marcado pela história e ideologia, a Análise de Discurso entende que não irá descobrir nada novo, apenas fará uma nova interpretação ou uma releitura; outro aspecto a ressaltar é que a Análise de Discurso mostra como o discurso funciona não tendo a pretensão de dizer o que é certo, porque isso não está em julgamento (2006, p. 681)”. A continuidade deste texto poderá ser consultada na carta editorial publicada na Revista de Pesquisa Qualitativa (Costa & Souza, 2016).

Algumas funcionalidades no webQDA, tais como a pesquisa das palavras mais frequentes e a pesquisa de texto, permitem ao investigador que explora esta técnica efetuar “pesquisas” aos documentos em análise. Permitem-lhe, por exemplo, procurar as palavras mais repetidas num determinado texto, codificar o resultado da pesquisa realizada, visualizar a nuvem de palavras, exportar para o Excel os resultados. A pesquisa de texto permite procurar expressões, palavras ou conjunto de palavras usando operadores boleanos: or, and e not (ver figura).

pesquisa de texto análise do discurso

Seguindo o que é apresentado na figura, o investigador pode formular uma questão: “Existe em torno das palavras, alimentação, exercício ou palavras sinónimas no texto dos entrevistados alguma indicação sobre as consequências para a saúde humana?” Na caixa “termos de pesquisa” pode-se definir as palavras ou expressões a pesquisar. É aqui que o webQDA irá “ler” as palavras que necessita. No exemplo dado, define: alimentação ||OU|| exercício utilizando o operador boleano OR. Depois de clicar em “gravar”, surgirá na funcionalidade Pesquisa de Texto um ficheiro webQDA com o nome designado, no exemplo, “Saúde”. Quando clica duas vezes para que seja exibida a pesquisa para as palavras alimentação ou exercício (ignora acentos). Esta pesquisa será realizada em todos os dados que estiverem na forma de texto nas Fontes. Ao clicar duas vezes sobre o ficheiro webQDA, abrir-se-á um separador que contém uma lista dos documentos onde estas palavras se encontram.

Existem outras opções que ajudam o investigador a tirar o melhor proveito do webQDA quando a técnica usada é Análise de Discurso.

Referências

Amado, J., Costa, A. P., & Crusoé, N. (2014). A Técnica de Análise de Conteúdo. In J. Amado (Ed.), Manual de Investigação Qualitativa em Educação (2a ed, pp. 301–350). Coimbra: Imprensa da Universidade de Coimbra.

Bardin, L. (2004). Análise de Conteúdo (3a). Edições 70.

Catalina, R., Caregnato, A., & Mutti, R. (2006). Pesquisa qualitativa: análise de discurso, 15(4), 679–684.

Costa, A. P., & Souza, F. N. (2016). Métodos Qualitativos de Análise de Dados: Peculiaridades da Análise do Discurso (carta editorial). Revista de Pesquisa Qualitativa, 4(6), 4–10. Retrieved from https://rpq.revista.sepq.org.br/index.php/rpq/issue/view/6/showToc%0A

Rocha, D., & Deusdará, B. (2005). Análise de Conteúdo e Análise do Discurso: aproximações e afastamentos na (re)construção de uma trajetória. Alea : Estudos Neolatinos, 7(2). https://doi.org/10.1590/S1517-106X2005000200010

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